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ESPECIAL
Asilos clandestinos
Em São Paulo, eles se concentram na Periferia

Fonte: Jornal da Tarde - 04.08.2003


Uma estimativa do Grupo de Atuação Especial de Proteção ao Idoso (Gaepi) aponta que pelo menos 200 asilos estão funcionando de forma irregular na capital. Deste total, 20% operam em condições deploráveis - semelhantes àquelas encontradas no Centro de Recuperação Missão e Fé, em Parelheiros, na Zona Sul, interditado pela Vigilância Sanitária no dia 11 de julho.

Agentes do Centro de Vigilância Sanitária (CVS), da Secretaria de Estado da Saúde, também estão preparando uma relação de estabelecimentos de saúde - asilos, casas de repouso e clínicas de reabilitação para dependentes de álcool e drogas - irregulares. Com esse trabalho, previsto para terminar este mês, fiscais do CVS devem começar a inspecionar todos os estabelecimentos que não trabalham de acordo com a legislação. Para esses casos, as penas variam de multas até a interdição total.

De acordo com o promotor do Gaepi, Edson Alves Costa, a maior parte dos asilos clandestinos - que operam irregularmente e são desconhecidos pelos órgãos fiscalizadores - está na periferia. A distância acaba dificultando a localização desses estabelecimentos.

"Dependemos basicamente de denúncias para começar a investigar", explica Costa. "Outro problema é que existem também alguns que são fechados e voltam a funcionar em outro lugar."

Mas, apesar de a denúncia ser a grande arma usada pelo Gaepi para encontrar estabelecimentos que atuam de forma irregular, Costa diz que nem sempre é possível contar com a ajuda de familiares para localizar os asilos que desrespeitam seus pacientes. "Quando uma família chega ao ponto de internar o idoso é porque ele se tornou um empecilho dentro de casa. Para se ver livre, ela acaba deixando num asilo, mesmo que em péssimas condições", diz.

A irregularidade mais grave encontrada nos asilos de São Paulo, segundo o diretor da Vigilância Sanitária da capital, Ocimar Azzolini, é a pouca quantidade de alimentos disponível nesses lugares. "A falta de comida em relação à quantidade de internos é muito comum. Quando existe alimento na dispensa, quase não há variedade", diz Azzolini.

Além disso, muitos estabelecimentos acabam autuados pela falta de projetos terapêuticos - como terapia ocupacional, fisioterapia e atendimento médico especializado. "Um idoso que chega a um asilo numa cadeira de rodas, por exemplo, poderia começar a andar. Mas infelizmente não é isso que ocorre.

Ele costuma sair da cadeira de rodas para uma cama", lamenta o diretor. Nos asilos que funcionam em sobrados, comuns na capital, faltam rampas e elevadores para os idosos que têm dificuldades de locomoção. Muitos acabam confinados no próprio quarto.

Antes de escolher um estabelecimento, a recomendação é saber se o local possui um alvará da Vigilância Sanitária. Para conferir se o abrigo atende a todas as exigências e está autorizado a funcionar o interessado pode ligar para o Disque Saúde (1520). Vale lembrar, porém, que o projeto de lei do Estatuto do Idoso, que está para ser votado no Congresso Nacional, diz que o idoso tem direito a morar com sua família.

Governo não cuida da terceira idade

A Prefeitura e o governo do Estado não administram asilos na capital. Com o processo de municipalização do serviço, a Prefeitura ficou responsável pela maioria dos programas sociais de atendimento ao idoso. Para alguns especialistas, no entanto, eles não atendem a demanda cada vez maior. Quem depende de cuidados especiais enfrenta ainda mais dificuldades para conseguir uma vaga na rede pública.

"O fato de não haver asilos do governo não seria um problema se os programas fossem capazes de dar conta das necessidades dos idosos", diz Tomiko Born, especialista em casas de longa permanência (como os especilistas se referem aos asilos) e membro da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia.

Segundo ela, a medida que a expectativa de vida da população aumenta, é preciso que os programas sejam aprimorados. "Só teto e comida não resolvem."

De acordo com a Secretaria Municipal de Assistência Social, os programas sociais atendem a cerca de 6 mil pessoas com 60 anos ou mais. Ao todo, a Prefeitura cuida de 94 centros de convivência - uma espécie de creche para idosos, com monitores e atividades. Na região central funciona um abrigo especial com capacidade para 60 idosos e uma moradia provisória - para 20 pessoas. Esses locais abrigam apenas idosos que não dependem de cuidados especiais.

O único programa para quem tem problemas de locomoção é o atendimento domiciliar. Diariamente, um agente visita o idoso, leva refeições e vê quais são suas necessidades. Hoje, o serviço atende a apenas 30 idosos.

Pastor acusado de maltratar idosos

O pastor Nilson Adalberto de Oliveira jura que sua única intenção era ajudar pobres e moradores de rua a largar a bebida. Com o intuito de colocar sua "missão" em prática, ele montou o Centro de Recuperação Missão e Fé, em Parelheiros, na Zona Sul, onde há cerca de três anos recebe pessoas de todas as regiões da cidade. No último dia 11, porém, uma blitz do Ministério Público Estadual e da Vigilância Sanitária descobriu que os 26 internos mantidos pelo pastor viviam em condições precárias.

Na última sexta-feira, uma assistente social do Grupo de Atuação Especial de Proteção ao Idoso (Gaepi) e policiais da Delegacia do Idoso voltaram ao centro de reabilitação. Onze pessoas - duas delas com mais de 60 anos - ainda estavam no local. A assistente social relatou que a situação geral do lugar melhorou, mas reafirmou que o pastor deveria fechar o centro.

No dia da vistoria, o centro foi parcialmente interditado e o pastor acabou indiciado por maus-tratos. Mesmo reconhecendo que a residência tem diversas irregularidades, o pastor alega que tudo não passou de uma briga religiosa.

"Os problemas encontrados aqui não eram relevantes. O que existe é um complô do antigo administrador contra mim", garante Oliveira.

Durante a blitz, no entanto, o promotor Edson Alves Costa, também do Gaepi, notou que os internos comiam alimentos com a data de validade vencida e carcaças de frango.

Nos banheiros faltam descargas em todos os vasos. Apenas um chuveiro tem água quente. Além disso, nenhuma das escadas tem corrimão. O centro não conta com médicos nem enfermeiras."Aqui é uma casa de apoio, não uma clínica. Se alguém precisa de atendimento, levamos ao hospital", diz o pastor. "O melhor tratamento para alcoólatras é tirá-los da frente do copo."

Em meio a toda essa falta de estrutura, viviam homens e mulheres de várias idades. Junto com dona Efigênia Barbosa, de 84 anos, brinca a pequena Bianca, de 3. A criança, filha de uma interna e neta de uma ex-interna, também mora no local.

Quem permanece no centro, à espera de um novo abrigo, não tem queixas.

"Adoro viver aqui", afirma Francisco Felipe Santiago, de 60 anos, que dorme num cômodo de 60 metros quadrados. O chão do quarto é de cimento e as paredes têm umidade. Durante o dia, Santiago ajuda outros internos e voluntários na limpeza.

"Quero buscar recursos e reformar isso aqui. Mesmo sem a ajuda do governo, cuido dessas pessoas; é isso que sei fazer", disse o pastor, que é divorciado e mora com os três filhos na parte superior do centro de recuperação. Ele garante que sustenta os pacientes apenas com doações.

Ex-internos, porém, contaram em depoimento à polícia que tinham de pagar R$ 50 por mês, mais uma cesta básica.



Repórter Bruno Tavares



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