A possibilidade de os sindicatos montarem seus fundos de pensão pode descaracterizar a real função dessas entidades, que é a de defender os interesses dos trabalhadores, na opinião de alguns especialistas consultados pela Folha.
Para outros, no entanto, é uma forma de impulsionar o crescimento do país, porque ajuda a elevar o nível de poupança interna e -como conseqüência - a diminuir a dependência de financiamentos externos.
Os que criticam o fato de os sindicatos poderem montar seus fundos fechados de previdência dizem que essas entidades têm natureza social, não econômica, e não devem acumular as funções.
"Um sindicato tem imunidade tributária. Quando opera uma atividade econômica, complica. É preciso separar a atividade econômica da social, na qual não há incidência de impostos. Tem de haver uma forte fiscalização nesse negócio", afirma o advogado trabalhista João José Sady.
Produto de shopping sindical
Para Luis Carlos Moro, presidente da Alal (Associação Latino-Americana de Advogados Trabalhistas), os fundos de pensão dos sindicatos são mais um "produto do shopping sindical". "Isso é desvio de finalidade. É o sindicato perdendo a natureza social e adquirindo funções de mercado."
Os sindicatos têm marcado território no mercado financeiro desde que conseguiram negociar o uso do FGTS para a compra de ações da Petrobras.
No governo Lula, o poder de negociação dessas entidades aumentou com o empréstimo consignado em folha de pagamento: elas negociaram com os bancos juros menores inicialmente para trabalhadores da ativa e, mais recentemente, para aposentados. A proposta nasceu com a CUT e foi adotada pelo governo.
Instrumento de sonegação
A possibilidade de os sindicatos incluírem nas convenções coletivas planos fechados de previdência complementar pode mascarar parte da remuneração do trabalhador. Os sindicatos entendem que esses planos podem compensar até um reajuste salarial menor do que o pedido pelos trabalhadores numa negociação.
"Na minha avaliação, isso é uma das maneiras de fraudar a remuneração. Plano de previdência complementar não tem natureza salarial. Esses fundos, nas mãos dos sindicatos, poderão se converter num instrumento de sonegação fiscal", afirma Moro.
A crítica que o movimento sindical recebe por entrar no mercado de fundos de pensão "não faz sentido", na opinião de João Felício, secretário-geral da CUT. "Se alguém interpreta que o papel do sindicato é só lutar por empregos e salários, está equivocado. O sindicato não pode oferecer ao sócio ações que vão além disso? Ninguém vai obrigar o trabalhador a contribuir na marra para um fundo de pensão."
A Associação dos Advogados de São Paulo, que lançou recentemente seu plano de previdência complementar, informa que não cobra pelo serviço. "Conseguimos taxas de administração favoráveis, muito menores que as cobradas pelo mercado, porque negociamos com nove bancos antes de optarmos por um deles. Temos um potencial de 84 mil sócios e isso pesa na hora de negociar", diz José Diogo Bastos Neto, presidente da associação.
Milko Matijascic, consultor para a área de seguridade social, não acredita que os fundos de pensão associativos vão decolar. "Cerca de 80% das pessoas trabalham para comer. A Previdência é a quinta prioridade na vida do cidadão. E mais: 95% dos brasileiros já estão cobertos pela previdência pública. O dinheiro para pagar a complementar é pequeno."
Para a Abrapp (reúne as entidades de previdência complementar), o crescimento dos fundos associativos é expressivo -21 planos abertos desde a regulamentação desses fundos em 2004. "Não se vende um plano de previdência como se vende um carro ou uma geladeira. É uma questão cultural, que começa a mudar no Brasil", diz Fernando Pimentel, presidente da Abrapp.
João Piza, ex-presidente da OAB-SP, vê os fundos de pensão como um instrumento para estimular a poupança interna e uma forma de "desafogar" o INSS.
"O fundo de pensão melhora a renda do trabalhador, o que a previdência pública não conseguirá fazer a curto prazo. Além disso, estimula a poupança popular, criando uma massa de rendimentos que tem importante participação no crescimento do país."
Fonte: Folha de São Paulo DA REPORTAGEM LOCAL
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